ducArte

das utopias com Arte.

sábado, janeiro 07, 2006

o que não se diz

Atrapalhei-me tanto que os felicitei por uma sonata de Schumann que não tinham tocado, e alguém me corrigiu em público de forma desagradável. A impressão que tinha confundido as duas sonatas por simples ignorância ficou espalhada no ambiente local e foi agravada por uma explicação aturdida com que tentei remediá-la no domingo seguinte na minha resenha crítica ao concerto.
Pela primeira vez na minha longa vida senti-me capaz de matar alguém. Voltei para casa atormentado pelo diabinho que sopra ao ouvido as respostas devastadoras que não demos a tempo, e nem a leitura nem a música mitigaram a minha raiva. [...]


in Memória das Minhas Putas Tristes, Gabriel Garcia Marquez

interrompido pela Rosa Cabarcas

[...] Por sorte, Rosa Cabarcas arrancou-me do desvario com um grito ao telefone: Estou feliz com o jornal, porque não pensava que fazias noventa mas sim cem. Respondi-lhe irritado: Viste-me assim tão fodido? Pelo contrário, disse ela, o que me surpreendeu foi ver-te tão bem. Que bom que não és daqueles velhos espertos que aumenta a idade para os julgarem em bom estado. E mudou sem transição: Tenho o teu presente. Surpreendeu-me de verdade: O que é? A menina, disse ela.

in Memória das Minhas Putas Tristes, Gabriel Garcia Marquez